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HISTÓRICO DO TRABALHISMO

  • trabalhismoemmovim
  • 12 de ago. de 2023
  • 25 min de leitura

Atualizado: 30 de ago. de 2023

“O caminho brasileiro para o socialismo”




1. SURGIMENTO DO MOVIMENTO QUE CRIOU O TRABALHISMO

BRASILEIRO


As origens do movimento que levou à criação do PARTIDO TRABALHISTA

BRASILEIRO (PTB) resultaram da consolidação de várias correntes políticas

existentes anteriormente, citadas adiante. Fundado por Getúlio Vargas, em

1945, quando se encerrou o período da Revolução de 1930, que compreendeu

o Governo Provisório e o chamado Estado Novo — o PTB fo depois fechado

pela ditadura militar, em 1965. Sua história de 20 anos de existência não pode

incluir aquele simulacro falsificado de partido trabalhista (o PTB de Ivete

Vargas), criado com o apoio daquela mesma ditadura (Golbery), quando foi

registrado no TSE em 1981.


Após descaracterizar-se como partido ligado aos sindicatos, como era

reconhecido desde 1945 até 1965, o PTB criado por Ivete afastou-se cada vez

mais da classe trabalhadora, tornando-se mais um partido da Direita brasileira.

O PTB apoiou todos os governos que se instalaram no Palácio do Planalto pós-

1965, inclusive aquele que fez a “reforma trabalhista” de 2016 (governo

Temmer).


Em 2022, caiu a máscara enganadora do falso PTB, então presidido pelo

inominável Roberto Jefferson, pois o partido não conseguiu sequer cumprir as

cláusulas de desempenho estabelecidas pela legislação. O PTB-fake perdeu,

então, o acesso aos fundos de recursos partidários e seu registro na Justiça

Eleitoral.


A sigla PTB e o nome do Partido tornaram-se novamente disponíveis para

outras organizações políticas, já existentes ou a serem criadas. Mas é

fundamental que não se repita a farsa que aconteceu há 42 anos, com a sigla

histórica caindo nas mãos de aventureiros e inimigos da democracia.


A Revolução de 1930, ao longo da qual foi gestado o PTB original, recolheu as

lições e resultados das lutas do passado dos trabalhadores brasileiros e

imigrantes, como as ações, protestos e greves dos sindicatos em formação

No plano ideológico, os líderes do movimento do que veio a ser a Revolução

de 30 apoiavam : (i) o espírito das ações anarquistas por maior e melhor

protagonismo dos trabalhadores urbanos, para garantir direitos trabalhistas e

previdenciários, além de (ii) incorporarem os ideais anti-oligárquicos do

Tenentismo.




2- UM POUCO DE HISTÓRIA



Foi a partir da Revolução de 30 que teve início a efetiva implantação da

República do Brasil — rompendo com a inconsequência dos 40 anos anteriores

(1888-1929), de falsa república. Os seguintes fatos e acontecimentos políticos

foram as marcas da Revolução de 1930:


 A linha política do Castilhismo gaúcho, que cultuava um “conjunto da

nação não assentado nas oligarquias, como em São Paulo e Minas

Gerais”. As oligarquias observavam uma hierarquia escravagista e Júlio

de Castilho fez questão de delas se separar. O movimento republicano

brasileiro tinha fortes vínculos com o Positivismo, com as ideias de

Augusto Comte e de Saint Simon, este um dos primeiros formuladores

das ideais socialistas.


 A Campanha Civilista de Rui Barbosa, de 1910. Muitos que tomaram

parte na Campanha Civilista ajudaram a fazer a Revolução de 30, como

foi o caso de João Mangabeira, um dos fundadores e Presidente do

Partido Socialista Brasileiro-PSB, além de ter sido Ministro do Governo

João Goulart.


 O Movimento Tenentista, expressando o que deveria ser a

modernização do País, com a superação do atraso e da pobreza, a

derrubada das oligarquias, o desenvolvimento com soberania nacional,

ideias que a Revolução adotou e promoveu.


 Os movimentos de trabalhadores que já vinham se organizando desde o

final do Século XIX, com a criação de ‘caixas de assistência’ e outros

arranjos assistenciais, fruto de ações anarquistas e das greves de 1906,

1912, 1917 e 1919; some-se as iniciativas pela criação de um Código do

Trabalho, as quais confluíram para a Revolução de 30.


 O ataque cerrado ao liberalismo, então considerado o principal

responsável pela instabilidade econômica mundial — como ainda é

hoje— foi outra das características mais firmes da Revolução. As

democracias liberais não ofereciam perspectivas de solução para as

crises sucessivas, em nenhum país do mundo.


Eram governos com estruturas frágeis, sem capacidade para intervir e cuidar da economia

em seus momentos de crise. O liberalismo econômico era coisa do século XIX, só servia aos interesses do grupos econômicos e às grandes nações. Aliás, essa visão se acentuou especialmente a partir da crise mundial de 1929.


Este ideário teve papel histórico na transformação do Brasil, em cerca de 50

anos, de um país agroexportador — como era no início dos anos 1930 — na

segunda maior potência industrial das Américas.


Além disso, teve papel decisivo no comando das lutas políticas que o povo brasileiro travou para afirmar sua soberania e preservar um conjunto significativo de direitos

trabalhistas e previdenciários.


Em função da legislação protetora dos direitos dos trabalhadores, criada a

partir da Revolução de 30, criou-se uma interação tríplice e circular entre: o

PTB, o Estado brasileiro e os sindicatos, o que garantia não só o fim dos

abusos do patronato, típicos das décadas anteriores, como também o

funcionamento da previdência social, inicialmente atrelada ao mesmo

Ministério.


É verdade que o velho PTB teve uma influência muito forte de Getúlio Vargas

que, de certa forma, conteve a corrente mais à esquerda, mais socializante do

partido. Getúlio era contrário à ideia da “luta de classes”, do embate entre a

classe trabalhadora e a burguesia, como uma trajetória viável para o

desenvolvimento brasileiro.


Insistia na necessidade de garantir um clima pacífico e de harmonia social para

promover o progresso do conjunto da nação. Porém, outras correntes do PTB,

sobretudo a liderada por Alberto Pasqualini, eram favoráveis a uma postura

partidária mais independente em relação ao líder Getúlio, ao seu governo e ao

atrelamento do Partido ao Ministério do Trabalho.


Para esses dissidentes, o importante era o PTB encampar as bandeiras populares do reformismo social e em defesa dos interesses dos trabalhadores.


Os últimos anos do Estado Novo foram marcados por uma grande proximidade

dos trabalhistas do PTB com os comunistas do PCB, estes últimos apoiando a

Constituinte com Getúlio e fortalecendo o movimento “Queremista”, corruptela

de “Queremos a Constituinte com Getúlio”.


3-TRADIÇÃO QUE VEIO DE LONGE E SE MANTEVE


O Queremismo, que se estendia por todo o país e envolvia grande parte da

sociedade, foi afinal frustrado pelos militares, que depuseram Getúlio em

outubro de 1945, pondo fim ao período iniciado pela Revolução de 30 e

continuado pelo Estado Novo. Foi vetada, assim, a hipótese da continuidade

de Getúlio no poder.


As candidaturas competitivas remanescentes eram: a do brigadeiro Eduardo

Gomes, pela UDN, apoiado pelo empresariado nacional e por seus parceiros

do capital estrangeiro, bem como por grande parte da classe média; de outro

lado, o marechal Eurico Gaspar Dutra, ex-ministro da Guerra nomeado por

Getúlio em 1936, agora lançado pelo PSD e também apoiado pelas forças

conservadoras, porém menos “entreguistas”.


Depois de muitas negociações e do convencimento de Getúlio, além de um

termo de compromisso, no qual Dutra se comprometia a nomear para o

Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio um quadro de sua confiança, mas

escolhido de comum acordo com o PTB, o Partido resolveu consensualmente

apoiar o Marechal.


Getúlio emitiu um Manifesto a todo o eleitorado brasileiro, apoiando Dutra.

Aquela eleição entrou para a História, porque se tornou convincente na

campanha o argumento que atribuiu ao brigadeiro Eduardo Gomes o

preconceito contra os “marmiteiros”, ou seja, o desprezo udenista aos

trabalhadores e pessoas de baixa renda, que, para os seguidores do

Brigadeiro, seriam os responsáveis por manifestações arruaceiras no processo

eleitoral.


O apoio do PTB ao candidato do PSD conduziu à vitória indiscutível de Eurico

Gaspar Dutra para governar o Brasil de 1946 a 1950. Infelizmente, porém, o governo Dutra foi conservador na política e não cumpriu o compromisso com o PTB de nomear um ministro do Trabalho afinado com aquele partido.


Além disso, fracassou também na economia, permitindo que os saldos

comerciais em divisas, acumulados a favor do Brasil durante a II Guerra,

(principalmente por conta das exportações de minério de ferro para as

siderúrgicas inglesas, que haviam sido negociadas para serem pagas a prazo e

depois da Guerra) fossem desperdiçados.


Não se esperava, porém, que tais dívidas em favor do Brasil fossem saldadas,

durante o governo Dutra, com a importação de quinquilharias, utilidades

plásticas etc., produzidas pelos ingleses, além de também abater do total da

dívida o valor (superavaliado) atribuído às ferrovias obsoletas, de

concessionárias britânicas, que já operavam no Basil.


Assim, com quinquilharias e ativos ferroviários superfaturados foi paga a maior

parte do minério brasileiro consumido nas usinas inglesas e dos aliados.

Além disso, durante o governo Dutra, o processo inflacionário elevou bastante

o custo de vida para os trabalhadores, sem que houvesse um correspondente

aumento dos salários. As mobilizações reivindicativas nessa direção

fortaleciam as correntes internas do PTB que pressionavam o Partido a adotar,

como suas, as bandeiras reformistas.


Isto se manteve até o início da década dos 50, comprometendo cada vez mais

o PTB com os projetos de reforma social e de nacionalismo econômico. Alguns

petebistas mais à esquerda, como Doutel de Andrade e Alberto Pasqualini,

achavam isso ainda insuficiente e pregavam que o Partido deveria adquirir uma

fisionomia mais comprometida com as lutas da classe trabalhadora.


As crescentes dificuldades do governo Dutra fortaleciam a candidatura de

Vargas pelo PTB, para a sucessão que seria disputada em 1950. Essa era a

aspiração que unia todas as correntes petebistas: o retorno ao governo federal

pela via de eleições livres e democráticas.


Por um lado, isso tornava recomendável ao ex-presidente um comportamento

cauteloso, a fim de preservar as boas relações que ainda mantinha com a

cúpula e com os principais representantes do seu aliado de sempre: o PSD,

apesar do rompimento com Dutra, durante seu mandato.


Formou-se uma aliança conservadora UDN-PSD-PR, visando ao lançamento

de uma candidatura daquelas forças do campo e da cidade, com o intuito de

impedir o retorno de Getúlio, no bojo de um processo legitimador de sua

liderança.


Tal propósito dos conservadores, de alinhar os quadros do PSD com a UDN,

no entanto, não foi suficiente: Getúlio e Ademar de Barros firmaram poderosa

coalizão, que foi decisiva em São Paulo; além disso, o temor da vitória de

Getúlio não superou as desavenças entre pessedistas e udenistas em muitos

redutos; finalmente, havia sólidos e antigos entendimentos, desde os tempos

da Revolução de 30, entre pessedistas e getulistas


A democratização do Brasil — a partir de 1945, mas especialmente a partir de

1951 (governo Vargas eleito) e se estendendo até o golpe de 1964 —

expressou o “melhor da política” até então desenvolvida no País, em termos de

resultados econômicos, da ampliação das liberdades civis e da criação de

instituições democráticas.


Foi nesse período que foram criadas a CSN, a PETROBRAS, a

ELETROBRAS, além de outras estatais produtivas e que contribuíram para

reafirmar a trajetória de desenvolvimento do Brasil e solidificar a soberania

nacional.


Um grande personagem político deste período foi o Presidente João Goulart, o

Jango, que fora eleito presidente do PTB, em maio de 1952, e viria a ser eleito

Presidente da República em 1960.


Contrariando as expectativas pessimistas de muitos, Jango, como presidente

partidário, fez um grande trabalho político de união das diversas correntes, de

construção e consolidação do PTB, a partir de sua posse, quando reafirmou os

objetivos sociais e políticos do Partido, preconizados desde a sua fundação.

Primeiro, a questão relativa ao relacionamento Estado-Trabalhador-Sindicatos

e da moderação dos movimentos sociais.


Logo depois Jango assumiria a cadeira de Ministro do Trabalho, da Indústria e

Comércio, com um poder extraordinário no cenário político, no que diz respeito

às grandes decisões de interesse nacional. Isso deixou de existir a partir do

golpe militar de 1964, quando o centro do poder governamental se concentrou

nos ministérios chamados econômicos, como a Fazenda e o Planejamento,

onde os interesses da classe trabalhadora sempre foram subestimados,

quando não negligenciados.


Quando assumiu como Ministro, Jango fez um trabalho magnífico no sentido de

desburocratizar o acesso dos dirigentes sindicais ao seu gabinete e passou a

agir direta e rapidamente com respeito às reivindicações sobre reajustes

salariais, regulamentação das profissões e ao direito de greve. Criou-se assim

a chamada “Arena da Cidadania”, à qual compareciam maciçamente lideranças

e militantes sindicais para apresentar e defender suas reivindicações.


O novo titular da pasta do Trabalho, apesar de sua origem (filho de

fazendeiros), por conta de seu dinamismo para equacionar os problemas

trabalhistas e previdenciários, conquistou a simpatia e o total apoio dos

dirigentes sindicais. Mas, por outro lado, começou a ser visto como motivo de

forte contestação dos opositores do Presidente Vargas, temerosos da real

possibilidade de os sindicatos assumirem o poder.


Nessa época começa a germinar a ideia conservadora da “república

sindicalista, que precisava ser combatida e inviabilizada”, bandeira que iria ser

fortemente agitada até o golpe de 1964 e durante o regime militar que se

seguiu.


A reação dos empresários e políticos conservadores foi exatamente

oposta a dos trabalhadores, com acusações de que Jango insuflava

movimentos grevistas e a tomada do aparelho de Estado pelos sindicalistas.


Os opositores de Vargas não dariam trégua a Jango até a sua saída do cargo

de Ministro de Estado do Trabalho, Indústria e Comércio.


O maior impulso para tal movimento se deu quando foram divulgados os

primeiros resultados dos estudos encomendados a uma comissão técnica, para

justificar o novo valor a ser proposto para o próximo salário-mínimo, pelo

Ministério do Trabalho, para compensar a defasagem criada no governo Dutra.


Os coronéis e tenentes lançaram então um manifesto protestando contra os

baixos salários da oficialidade jovem, enquanto os coronéis pressionavam pela

queda de Goulart no gabinete ministerial.


Logo a seguir, Jango divulgou sua proposta de dobrar o valor do salário-

mínimo (de CR$ 1.200 para 2.400), o que explodiu como uma bomba nos

meios políticos adversos, provocando reações negativas, inclusive, do então

Ministro da Fazenda, Osvaldo Aranha, incumbido de promover a estabilidade

financeira do governo Vargas.


As pressões dos opositores aumentaram consideravelmente, acusando o

presidente de compactuar com os excessos de seu Ministro do Trabalho,

mesmo contrariando a política de estabilização econômico-financeira do país.


Goulart também deu início a uma política trabalhista para o campo, que

evidentemente enfrentou forte resistência dos proprietários rurais, que se

faziam representar principalmente pelo PSD, mas que contavam também com

o apoio da UDN.


A passagem de Jango pelo Ministério do Trabalho coincide com um período de

grandes realizações do governo Vargas que marcariam a história do Brasil: é

de 3 de outubro de 1953, a promulgação da Lei 2004, que instituiu o monopólio

estatal do petróleo — criando a Petrobras e suas subsidiárias, como órgãos

executores da política estatal.


A administração de João Goulart no Ministério do Trabalho durou apenas 9

meses incompletos (junho/53 a fevereiro/54), pois Vargas o demitiu para

aplacar a ira dos militares e civis conservadores.


A ousadia da proposta de João Goulart sobre o salário-mínimo retirou-o do

proscênio formal da política trabalhista, pois deixou de ser Ministro de Estado.

Porém, cerca de 70 dias após sua exoneração, o presidente Vargas decretou,

no primeiro de maio seguinte, o aumento do salário-mínimo, para o valor de

CR$ 2.400,00, como Jango havia proposto.


Em agosto de 1954, em meio à crise que se agravava desde o ano anterior,

Getúlio comete o suicídio e publica a carta-testamento, dando continuidade à

forte influência que exerceu sobre o povo e o PTB, inclusive após seu

desaparecimento. A carta-testamente tem atualidade até os dias atuais e

constitui um documento-pilar do novo PTB que estamos resgatando.



4- O PTB REFORMISTA QUE QUIS MUDAR O BRASIL


A morte de Vargas e a ascensão do vice, Café Filho, para cumprir um mandato

tampão de poucos meses, num clima de grande comoção nacional e de crise

econômica séria, gerou um clima inteiramente inesperado.


Café Filho havia sido indicado pelo PSP, de Ademar de Barros, para a chapa

encabeçada por Getúlio que vencera as eleições de 1950 e governava com os

dois partidos vencedores (PTB e PSP), mas também em aliança com o PSD e

a UDN.


Ao PTB cabia apenas a pasta do Trabalho, Indústria e Comércio.

Café Filho, ao assumir a Presidência, deu uma forte guinada política valendo-

se do prestígio de seu partido, o PSP, no maior Estado da Federação, São

Paulo.


Como tinha, ele próprio, grande simpatia pela UDN, cercou-se dos quadros udenistas para governar. Somente seu Ministro da Justiça (Seabra

Fagundes) e o Ministro da Guerra (Henrique Lott) não eram próceres

udenistas.


Ao tomar posse, o presidente Café Filho, além das dificuldades econômicas,

deparou-se com um quadro de tensões sociais muito acirradas e a forte

oposição dos trabalhistas e nacionalistas — do PTB, do PCB e dos sindicatos

— imbuídos da mensagem contida na carta-testamento que despertara no

povo sentimentos nacionalistas e antiamericanos.


O novo presidente, seguindo a orientação dos conservadores que o apoiavam,

passou a perseguir os trabalhistas e getulistas, suspendendo seus direitos

políticos, cassando o registro do PTB e demonstrando que não queria contar

com a participação destes em seu governo.


Não obstante essa determinação, o clima emocional gerado pelo desaparecimento de Vargas fez com que CaféFilho recuasse, nomeasse um quadro do PTB como ministro do Trabalho e suspendeu suas restrições à ação do PTB e dos sindicatos a ele vinculados.


O PTB, no entanto, decidiu-se por fazer oposição sistemática ao governo Café

Filho e considerou o novo ministro do Trabalho, Napoleão de Alencastro

Guimarães, como um dissidente do PTB, pois se dispusera a integrar um

ministério de um governo tão conservador quanto aquele.


Aliás, o desaparecimento de Vargas implicou num endurecimento das posições

do PTB, afastando-se do fisiologismo e decidindo se defender de quaisquer

investidas que pudessem levar a um desvio de sua trajetória de luta pelos

projetos trabalhistas e nacionalistas. O suicídio de Vargas revigorara o PTB,

com base na força e simbolismo de sua imagem e nos princípios nacionalistas

da carta-testamento.


Não obstante isso, João Goulart e seu companheiro Rui Ramos perderam as

eleições parlamentares de outubro para o Senado, no Rio Grande do Sul.

Alberto Pasqualini concorreu à eleição para o Governo do Estado e também foi

derrotado.


No entanto, o PTB elegeu boas bancadas na Câmara Federal e no

Senado, além de três governadores de Estado. No plano nacional, apesar da

derrota do PTB no Rio Grande do Sul, o respeito pela figura de João Goulart

cresceu ainda mais, em termos nacionais, sendo considerado o verdadeiro e

legítimo herdeiro de Getúlio Vargas.


Coube a ele rearticular o que restava do velho varguismo e garantir uma

sobrevida de prestígio para aquele regime populista e para a corrente política

que expressava seu pensamento e ação.


A UDN, durante o resto do ano de 1954 e ao longo de 1955 procurou provocar

polêmicas e promover conflitos políticos relativos ao projeto getulista,

envolvendo os militares e os políticos udenistas no sentido de acreditarem

numa possível desestabilização da aliança PSD-PTB, o que poderia viabilizar o

projeto de poder da UDN. A estratégia udenista consistiu em escolher João

Goulart como o alvo personalizado a ser atacado.


O símbolo vivo do getulismo, seu herdeiro, o político com maior capacidade de

mobilizar os setores populares e a força indicada para renovar a aliança

eleitoral com o PSD, Jango apostava na candidatura do ex-governador mineiro,

Juscelino Kubitschek, visando as eleições de 1955.


Em contrapartida, o nome de Goulart era bem recebido no PSD, ainda mais que Jango e o PTB contavam com a simpatia dos comunistas e somavam o seu eleitorado para a eleição

nacional mais importante. Após a morte de Getúlio, o PCB buscara se aproximar dos trabalhistas, para em seguida também apoiar a candidatura de Juscelino Kubitscheck à Presidência.


O processo eleitoral com vistas às eleições presidenciais de 1955 começou a

ser articulado ainda em outubro do ano anterior, a partir dos resultados das

eleições parlamentares recém realizadas.


O presidente substituto, Café Filho, propôs a tese da ‘união interpartidária’, que

consistiria “em unir todos os partidos em torno de um só candidato a

Presidente, o que afastaria o país de uma crise política grave e de uma

inevitável instabilidade institucional”. Estas eram previsíveis a curto prazo,tendo em vista “aquela hora difícil por que passava a nação”, com ameaças para a preservação das instituições democráticas.


A ideia não encontrou acolhida no PSD nem em seu aliado, o PTB, que

percebiam ser aquela estratégia, defendida com ardor pelo Presidente Café

Filho, nada mais do que uma tentativa do PSP e da UDN de buscarem um

consenso de todos os partidos para apoiarem os candidatos por eles

escolhidos.


Diante da resistência observada, em 1954 Café Filho recuou e

depois retomou a ideia no início de 1955. Investiu na tese da candidatura

única, adiantando que para que isso acontecesse Juscelino deveria retirar sua

pretensão de ser o próximo Presidente.


A reação de JK foi: manter a candidatura e vê-la homologada pela convenção

do PSD e em seguida pela convenção do PTB, consagrando também a

candidatura de João Goulart para vice de JK, que se transformara no

verdadeiro símbolo da legalidade democrática e do nacional-

desenvolvimentismo.


No acordo interpartidário das duas correntes, caberia ao PTB os ministérios do

Trabalho, Indústria e Comércio, que tradicionalmente ocupava, e também o da

Agricultura, uma velha aspiração gaúcha. Tal tese também ligava-se ao

propósito de amplos setores trabalhistas de incluir a reforma agrária como item

fundamental de um futuro programa de governo.


A VIII Convenção Nacional do PTB consagrou, como segundo ponto de um

programa mínimo de seis pontos, que a reforma agrária viesse a ser realizada

com brevidade, através da extinção do latifúndio improdutivo, do amplo crédito

para a formação da pequena propriedade e da extensão da legislação

trabalhista ao campo. O compromisso com a reforma agrária foi também

condição exigida pelo PTB para participar e apoiar a chapa encabeçada por

Kubitschek.


Os setores conservadores, proprietários de terras do PSD, resistiram a essa

proposta de reforma agrária e quiseram patrocinar a escolha de outro petebista

(Oswaldo Aranha) para compor a vice-presidência.


Todavia prevaleceu a tese de que era preferível para os pessedistas conciliarem com o grupo do PTB pró-Jango, que era hegemônico no Partido, já tendente para o reformismo e que

possuía grande peso eleitoral.


Como um subproduto desse programa petebista resultou também uma maior

aproximação com os comunistas, que se aliaram não só na campanha eleitoral,

como também no decorrer de todo o quinquênio do governo de JK.


O conjunto de pontos programáticos do PTB que o candidato pessedista se

comprometeu a respeitar foram tão importantes, que cabe enunciá-los:


1) A defesa das liberdades, a garantia ao trabalho e o combate aos trustes;


2) A realização de uma reforma agrária, com extensão da legislação

trabalhista e previdenciária ao campo;


3) A reforma eleitoral, visando anular a influência do poder econômico nas

eleições;


4) O estímulo à educação e à cultura, tornando realidade o ensino primário

gratuito;


5) A defesa da saúde e da medicina pública, através da unificação e

uniformização de medicamentos pelo Estado;


6) O combate à inflação;


7) A construção de uma rede viária e de obras contra a seca — amparo e

proteção à indústria nacional. O Estado deveria expandir a rede viária nacional e, também, estabelecer incentivos à produção industrial nativa.


À época, esta era uma plataforma abrangente e consistente com os objetivos

de promover a legalidade democrática, o nacional-desenvolvimentismo e os

interesses da classe trabalhadora, presentes no discurso juscelinista.


Mas também era uma provocação para as classes conservadoras e para os

militares não-nacionalistas, que foram derrotadas na eleição de 3 de outubro

de 1955.


A aliança PSD-PTB foi acertada formalmente pela Direção Nacional do PSD no

início de abril daquele ano. Logo em seguida, a Convenção Nacional do PTB

homologou o nome de João Goulart para, como candidato a Vice, integrar a

chapa com Juscelino para Presidente.


Nessas negociações, ficou confirmado o entendimento adicional de que o PTB

comandaria também o Ministério da Agricultura, além do Ministério do

Trabalho, Indústria e Comércio. Isso abria a perspectiva de estender aos

trabalhadores do campo a ação sindical e a Justiça do Trabalho, já praticadas

nas áreas urbanas.


A rigor, isto abria o caminho para os futuros conflitos entre as lideranças

sindicais e segmentos do PTB, de um lado, com as oligarquias rurais

representadas pela bancada conservadora do PSD e da UDN, de outro, o que,

a longo prazo, iria fragilizar a aliança PTB-PSD que durava desde 1945.


O PCB, ainda proscrito, se aproximara bastante do PTB após a morte de

Getúlio, mas não contava com a simpatia de JK e da cúpula pessedista. No

entanto, por intermédio de uma carta de sua maior liderança, Luiz Carlos

Prestes, lida na Convenção do PTB, os comunistas manifestaram seu o apoio à

chapa PSD-PTB.


Os meios militares reagiram duramente — inclusive o Marechal Lott, forte

aliado de JK — aumentando a já elevada tensão política, com várias pressões

para que Café Filho adiasse as eleições.


Esta orientação não foi seguida e, no dia 3 de outubro, foram eleitos Kubitschek (3,079 milhões de votos) e João Goulart (com 3,6 milhoes de votos), o candidato a Vice com mais votos do que o candidato a Presidente.


Nessa ocasião ocorreu a muito famosa tentativa de golpe institucional

provocada pelos golpistas da UDN, alegando que o candidato eleito (JK) não

alcançara a maioria absoluta dos votos. Por isso tentaram impedir judicialmente

a posse de JK.


Mas foram frustrados pela determinação do Ministro da Guerra

de então, Marechal Henrique Teixeira Lott, em 11 de novembro de 1955, que

manteve a validade do resultado das urnas proclamado pela Justiça Eleitoral.


Desse modo, JK e Jango tomaram posse no começo de janeiro de 1956, com o

Presidente fazendo um discurso marcante, em que prometia realizar um

governo de impacto, que transformasse o perfil da economia brasileira,

avançando no processo de industrialização, além de suspender o Estado de

Sítio, imposto antes por Café Filho, com o apoio do Congresso, e também

decretar o fim da censura à imprensa.


Ao lado de medidas de redemocratização muito importantes, JK construiu uma

agenda desenvolvimentista, em bases nacionais. Nessa direção, lançou

ambicioso Plano de Metas, com vários projetos de infraestrutura (estradas,

portos, energia, etc.), expansão do consumo doméstico de bens e serviços e

aumento das exportações.


Todo esse ambicioso programa pressupunha, é claro, um ambiente político de

“respaldo” (no Congresso, governos estaduais e municipais, partidos etc.), e

ampla base social de apoio — compreendendo empresários rurais e urbanos,

nos setores da agropecuária, comércio, indústria e serviços, além dos

trabalhadores do campo e das cidades. Tarefa nada fácil, que Getúlio intentara,

sem sucesso, durante seus longos anos no Poder.


Na base da aliança política e social pretendida, e que sustentou o governo JK

durante todo o seu quinquênio, estava a aliança PSD-PTB. As duas bancadas

garantiam maioria nas duas casas do Congresso. Ela prevaleceu íntegra

durante os primeiros anos da gestão JK, apesar de algumas dificuldades

políticas sérias. Mas começou a desmoronar na segunda metade do mandato

presidencial, constituindo-se em importante fator de instabilidade na sucessão

de JK, em 1961.


Sob a hegemonia do PSD, os partidos da aliança trabalharam em conjunto

durante o governo JK. Um governo arrojado que procurava realizar

diuturnamente o cumprimento das metas estabelecidas pelo Presidente. O

lema era “realizar 50 anos em 5” e, para cumpri-lo, Kubitscheck construiu

Brasília, realizou suas metas industriais, seus programas rodoviários,

energéticos etc. Fez um governo inovador. E de muitas realizações.


Mas, ao lado do avanço naqueles projetos, houve um enorme retrocesso em

matéria de bem-estar social. Ao invés de ampliá-lo em seu governo, o que

houve na gestão JK foi a contenção salarial e restrições ao distributivismo de

benefícios, que eram as marcas da política trabalhista do PTB desde 1945.


Apesar de o já referido acordo eleitoral PSD-PTB, que precedeu a eleição de

1955, ter reservado para o partido do Vice os órgãos seguintes:


 o Ministério do Trabalho

 a Presidência das autarquias da Previdência Social ligadas àquela Pasta

 o primeiro escalão dos órgãos do ministério do Trabalho, Indústria e

Comércio; além do

 o Ministério da Agricultura,

a hegemonia do PSD sobre o PTB na distribuição dos cargos foi notória.


No que tange à política trabalhista e das relações Estado-trabalhadores-

sindicatos — que o PTB conhecia tão bem, desde os anos 50 — a execução

das mesmas não foi simples para os diretores do Ministério ligados ao PTB.


Muitos cargos foram preenchidos por pessoas da confiança pessoal de

Juscelino, que correspondiam a funções muito importantes e tinham o poder de

interferir nos processos correspondentes, impedindo a hegemonia petebista

típica do passado.


Juscelino não cumpriu rigorosamente a agenda combinada com o PTB e

Jango, antes das eleições (abril de 1955). Mas a legenda, especialmente suas

bancadas no Congresso, adotou-a como bússola a seguir no longo caminho

para alcançar nitidez ideológica, nos cinco anos do mandato de JK.


Nesse período o PTB se tornou mais assertivo com respeito à pauta de reformas

sociais e de afirmação dos interesses nacionais, ainda que estes não fossem

priorizados nas decisões de Juscelino.


No Congresso, apesar do PTB ter crescido bastante em 1958, em termos de

bancadas, tinha apenas cerca de 20% das cadeiras, o que significava que o

Partido merecia atenção do governo, para garantir os resultados das votações

de seu interesse, mas não tinha força suficiente para colocar em pauta, fazer

votar e aprovar as propostas das reformas agrária, urbana, tributária etc.


Esse conjunto de fatores, entretanto, ajudou a dar coesão à constelação

composta de cinco governadores de Estado e à bancada de deputados

federais do PTB eleitos em 1958, que (passou a ser mais rica em termos de

quadros políticos de grande peso regional) e situados mais à esquerda do líder,

João Goulart. Os integrantes desse elenco de primeira grandeza foram:


Governadores eleitos: Leonel Brizola (RS), Roberto Silveira (antigo ERJ), José

Parsifal Barroso (CE), Francisco de Chagas Rodrigues (PI) e Gilberto

Mestrinho (AM).


Deputados importantes eleitos: Almino Affonso, Sérgio Magalhães, Doutel de

Andrade, Luiz Fernando Bocaiúva Cunha, Fernando Santana, Eusébio Rocha,

José Gomes Talarico, Roland Corbisier, Wilson Fadul, Aarão Steinbruch e

Fernando Ferrari (este depois rompeu com o PTB e fundou o MTR), entre

outros.

e lideranças sindicais de expressão, como Clodsmidt Riani e Sinval Bambirra.


Os militantes do PTB engajados nas propostas de reformas sociais mais

avançadas se organizaram e constituíram grupos de partidários do PTB (Grupo

Compacto) e de outros partidos (inclusive da UDN), desde 1956 e até 1963.


Com o surgimento da bancada eleita em 1962, maior que a anterior,

constituíram-se as frentes interpartidárias: Frente Parlamentar Nacionalista

(FPN), a Frente de Libertação Nacional (presidida por Leonel Brizola e

coordenada por Mauro Borges, governador de Goiás) e outros grupos, que se

articulavam com a UNE, as Ligas Camponesas e outras entidades de

representação da sociedade.


No quinquênio JK-JG, houve nítido fortalecimento das esquerdas, espalhadas

em várias siglas. Isso teve duas consequências sérias, ainda que até certo

ponto inevitáveis: o enfraquecimento da aliança PSD-PTB, que acabou

rompida sem maior formalidade, e o início da organização mais sólida da

direita, liderada pela UDN e integrada pela ala conservadora do PSD e de

outras organizações menores.


A aproximação do pleito presidencial de 1960, desencadeou intensa

movimentação daqueles que queriam manter a aliança do PSD com os

petebistas conservadores, de modo a preservar o mando de poder político que

vinha governando o Brasil há 14 anos.


Juscelino, porém, adotou outra estratégia, visando aproximar-se da UDN,

compor uma nova aliança com ela e disposto a adotar a candidatura de Juracy

Magalhães, que acabou descartada em função do surgimento da candidatura

diferenciada de Jânio Quadros, ex-prefeito de São Paulo.


A campanha de Jânio foi consagrada na convenção de seu partido e tornou-se,

ao final, vitoriosa em função do talento eleitoral do candidato (capacidade de

comunicação com as lideranças populares e aproximação com o movimento

sindical), e da oportuna proposta de moralização da política, simbolizada pela

vassoura, que foram capazes de superar os obstáculos surgidos na estrutura

de sua organização partidária.


Inicialmente, JK tentou construir um candidato “de união nacional” (como antes

foram os planos de Café Filho, em 1954), mas acabou desistindo dessa

eventual aliança com a UDN, quando se tornou claro que o candidato seria

Jânio Quadros, não Juraci Magalhães.


Juscelino foi, então, compelido em 1959 a apoiar o General Lott (que havia garantido sua posse na Presidência, emnovembro de 1955, quando da tentativa de golpe udenista, justificado pela “insuficiência de quórum”).


A candidatura do General Lott foi, então, homologada na convenção do PSD e

logo depois foi consagrada pelo PTB-PR — que daria João Goulart como Vice

— sob a liderança do deputado San Tiago Dantas, que usou como justificativa

a vantagem de preservar a tradicional aliança PSD-PTB.


Por incrível que possa parecer, os partidos e o eleitorado criaram uma situação

paradoxal (mas compatível com a realidade), em que as pessoas aptas a votar

escolhiam: a aliança PSD-PTB para eleger o Poder Executivo, reformista, e a

aliança PSD-UDN para impedir, pelo Legislativo, o avanço dos programas

reformistas e nacionalistas.


Como resultado, o povo elegeu a chapa Jan-Jan (Jânio-Jango), sem

capacidade de prever os desdobramentos desse processo:


  •  a renúncia inteiramente inesperada de Jânio, em agosto de 1961, oito

meses depois de sua posse;

  •  a posição golpista dos militares então nos postos de comando,

incentivados pela direita udenista, no sentido de impedir a posse do

Vice-Presidente Goulart (que estava na China, em missão oficial), como

substituto legítimo do Presidente que renunciou;

  •  para voltar ao Brasil, Jango teve de desembarcar no Uruguai e aguardar

as negociações em curso, para a adoção ilegítima do Parlamentarismo,

criado artificialmente e de afogadilho pelo Congresso Nacional, por

Emenda Constitucional (votada pelo Congresso é verdade, mas com

este sob coação), em setembro de 1961.

  •  e a investidura de Jango na Presidência, como chefe de Estado, mas

tendo na Chefia do Governo um primeiro-ministro, apontado pelo

Presidente, mas tendo que ser homologado pelo Congresso. De acordo

com a Emenda Constitucional, a ratificação ou rejeição popular do novo

regime só seria feita em plebiscito, em 1965, após quatro anos de

experiência parlamentarista.


Na crise política gerada pela renúncia de Jânio (cuja verdadeira intenção

pessoal nunca foi elucidada), destacaram-se a coragem e a habilidade política

do governador Leonel Brizola, do Rio Grande do Sul, que organizou uma

resistência armada de civis e militares em defesa da legalidade e uma cadeia

nacional de rádios, para divulgar em todo o território nacional uma

programação de resistência ao golpe e de defesa das instituições democráticas

constitucionalmente constituídas.


Essas atitudes de liderança deram a Leonel Brizola uma projeção que extravasava as fronteiras do Rio Grande do Sul, transformando um líder regional num líder nacional.


Apoiados pelos militares — temerosos dos riscos, falsamente criados, de

implantação no Brasil de um regime comunista, ou dominado pelos sindicatos

— os líderes da direita negociaram com os parlamentares da confiança do Vice

Presidente (principalmente Tancredo Neves e Brochado da Rocha, ambos do

PSD e os primeiros-ministros sucessivamente eleitos) os termos de acordo que

levaram Jango, naquelas condições golpistas, a aceitar, em 1961, a

Presidência no regime parlamentarista, mantido o calendário eleitoral com

eleições parlamentares previstas para 1962.


Honrado o cronograma das eleições, o PTB elegeu 116 deputados e passou a

ter grande destaque na política nacional, pois o Partido, tendo o Presidente da

República, tornou-se a força hegemônica no seio da aliança PSD-PTB e o

segundo maior partido do País (o PSD elegeu 118 deputados, em 1962).


Nesse contexto, as diferentes facções do PTB assumiram posições ideológicas

mais assertivas, comprometendo, cada vez mais, a direção do Partido com as

reformas sociais.


Jango teve papel fundamental nesse encaminhamento, porquanto seus discursos foram sempre muito afirmativos com respeito à necessidade urgente das reformas de base e do apoio às empresas brasileiras, como motor principal do nacional-desenvolvimentismo.


Com habilidade, Jango construiu as condições para antecipar para janeiro de

1963 o plebiscito sobre o Parlamentarismo, previsto originalmente para 1965,

abreviando, assim, para apenas 16 meses a duração daquela experiência

imposta à Nação.


Do total de 18,6 milhões de eleitores inscritos para votar no

Plebiscito, somente 66% votaram. Do total de votantes, 77% disseram NÃO ao

parlamentarismo, fazendo com que Jango reassumisse as funções plenas de

Presidente da República.


As novas lideranças nacionais da esquerda e do nacionalismo, de diferentes

partidos — à frente Leonel Brizola, Miguel Arraes, Mauro Borges, Francisco

Julião, Almino Afonso, então Ministro do Trabalho, etc. — pressionavam para

que Jango implantasse as reformas de base “na lei ou marra”, com a ressalva

de que o PCB, premonitoriamente, insistia em preferir a via legal.


Goulart administrava os conflitos internos buscando a posição mais equilibrada

possível. Mas as forças da direita, com financiamento de empresários

brasileiros e fontes de recursos do exterior (IBAD) se organizavam para dar um

golpe, com o apoio dos oficiais (ex-tenentistas das décadas de 1920 e 30), que

influíam e lideravam as Forças Armadas desde a Revolução de 30.


Enquanto isso, o movimento sindical ligado ao PTB e ao PCB radicalizava e se

recusava a cumprir os ritos de conciliação e do controle dos trabalhadores,

características típicas da política populista que vinha desde os tempos de

Getúlio Vargas.


O Presidente da República oscilava. Ora querendo cooptar o apoio dos

proprietários rurais e dos empresários urbanos, que reagiam negativamente a

essa aproximação, ameaçados pela reforma agrária e pelas reivindicações dos

trabalhadores das cidades por melhores salários e condições de trabalho.


Ora tentando agradar os sindicatos e líderes trabalhistas, como, por exemplo,

através da aprovação do Estatuto do Trabalhador Rural, aprovada em março

de 1963. No geral, porém, os trabalhadores tendiam a se afastar do governo,

em função do encolhimento dos salários e vantagens.


O pacto populista, que prevalecera durante mais de 30 anos, foi denunciado

pelos sindicatos oficiais e pelos políticos do PTB ligados aos movimentos

populares de massas. Tal denúncia prenunciava o desencadear de um

processo novo, cujas características ainda não eram explícitas, mas que

renegava a “conciliação” como método de cooptação.


Isso também inviabilizava as tentativas de articulação dos sindicatos de trabalhadores do

campo e das cidades com segmentos nacionalistas da burguesia, que não

mais queriam acordo.


Foram inúmeras greves, manifestações de rua, congressos e frentes populares

que se organizaram para dar apoio à adoção das reformas de base propostas

pelo Presidente Goulart.


Na busca da reconquista do apoio popular, em dezembro de 1963, Jango

decretou o monopólio estatal sobre a importação do petróleo e da gasolina; em

janeiro de 1964, decretou a legislação que passou a regular a remessa de

lucros para o estrangeiro; e em 19 de fevereiro, do mesmo ano, decretou o

novo salário-mínimo, com aumento de 100% (a exemplo do que fora feito 10

anos antes pelo Presidente Getúlio Vargas, em 1/05/54, por sugestão de

Jango, então ex-ministro do Trabalho) e dispositivos para preservar seu valor

real, em resposta às pressões da classe trabalhadora e ameaças de greve

geral.


Nessa ocasião, João Goulart comprometeu-se com o encaminhamento dos

projetos reformistas, discurso que foi respondido com a promessa de

disposição de luta dos trabalhadores para defender aquela agenda de

reformas. Aparentemente, governo e sindicatos adotaram nesse momento uma

linha de ação unitária.


O famoso comício da Central do Brasil, em 13 de março (a 19 dias do golpe),

com a presença de cerca de 200 mil pessoas das mais diferentes correntes de

esquerda, ou próximas a elas, uniram-se em defesa de um programa que era

absolutamente inaceitável para as forças conservadoras: a da transformação

dos padrões de dominação burguesa, que vigiam desde o primeiro governo

populista, ainda que por via pacífica.


O Governo João Goulart foi deposto por um golpe militar, ainda que se tenha

tentado disfarçar isso com o anúncio (falso) pelo Presidente do Senado de que

o Presidente da República estava fora do País.


Criou-se, assim, a vacuidade artificial do cargo de Presidente da República, que foi forçado a viajar para o Uruguai para se exilar e não ser preso. Os principais integrantes do governo e

líderes dos partidos reformistas, aliados de Goulart, também foram procurados

e alguns chegaram a ser presos.


Leonel Brizola, cunhado de Jango e um dos líderes petebistas cuja prisão era

das mais cobiçadas, também se exilou no interior do Uruguai, onde sua esposa

(irmã de João Goulart) tinha uma propriedade rural na qual se criavam ovelhas

e gado.


Tomando em conjunto o exílio de Brizola no Uruguai, nos Estados Unidos e em

Portugal, seu afastamento do Brasil durou 15 anos (1964-79), quando afinal foi

garantido que ele e seus familiares poderiam voltar ao Brasil, para viver em

liberdade.


Além de ter sido deputado estadual e federal gaúcho, prefeito de Porto Alegre

e Governador do Rio Grande do Sul, Brizola se elegera deputado federal pelo

Estado da Guanabara em 1962, com um quarto do total de votos válidos (cerca

de 270 mil votos).


Com seu retorno ao Brasil, Brizola imaginava resgatar e recuperar a gloriosa

legenda do PTB.


5 – FECHAMENTO DOS PARTIDOS POLÍTICOS, O BI-PARTIDARISMO,

A VOLTA DO PLURIPARTIDARISMO, SURGIMENTO DO PT, DO PDT E

DO PTB


No final de outubro de 1965, após a vitória de vários oposicionistas nas

eleições do início daquele mesmo mês, o Presidente-ditador Castelo Branco

baixou o Ato Institucional n.2, extinguindo os partidos políticos então

existentes, substituindo-os pelo bipartidarismo (ARENA e MDB), intervindo no

Judiciário e cometendo outras violências políticas, tais como novas cassações

etc.


Após quinze anos de ditadura, em 1979, foi aprovada a Lei da Anistia (Lei no.

6.683, de 28/08/79), etapa planejada pelo Presidente-ditador Ernesto Geisel

que criou o processo de abertura política e preparou o fim do regime de

exceção.


A Anistia permitiu libertar presos políticos condenados e, também, o

retorno de exilados, como foi o caso de Leonel Brizola, que estava asilado em

Portugal e aprendendo o que era a Social-Democracia Européia, graças a

ajuda do então Presidente Mário Soares.


Brizola voltou ao Brasil em 1979, idealizando a restauração do Partido

Trabalhista Brasileiro como um movimento de massas radical, nacionalista, de

esquerda e abrigando os líderes históricos sobreviventes e seguidores de


Vargas. Era esse o seu projeto em 1964, quando, ainda antes do golpe, reatou

suas relações com Jango, que estavam estremecidas, e dirigia — junto com o

governador Mauro Borges e os deputados Barbosa Lima Sobrinho, Miguel

Arraes, Aldo Arantes (então líder estudantil) e outros — a FLN-Frente de

Liberação Nacional.


Antes do golpe de 1964, sem favor algum, Leonel Brizola era o líder

nacionalista mais empolgado e radical que militava na política brasileira,

responsável pela criação dos “Grupos dos 11”, ou “Comandos Nacionalistas”.

Foram envolvidas cerca de 60.000 pessoas, em todo o país, para atuar em

defesa das teses de Brizola.


Porém, quando de seu retorno a São Borja, em 7/09/79, Brizola encontrou

várias dificuldades para reerguer o PTB. A começar pelo fato de o sistema

vigente ainda ser bipartidário, apesar de estar em seus estertores.


O pluripartidarismo só foi restabelecido em dezembro seguinte, quando foi

editada a Lei 6.767, de 20/12/79. Ainda assim, Brizola e seus seguidores

estavam impedidos de usar o nome histórico de Partido Trabalhista

Brasileiro, pois o mesmo era objeto de disputa com um grupo rival,

encabeçado pela deputada Ivete Vargas, sobrinha-neta de Getúlio

Vargas, de boas relações com os chefes da ditadura militar.


Somente em 1980, houve uma decisão do Tribunal Superior Eleitoral,

que finalmente concedeu a sigla ao grupo liderado por Ivete Vargas,

radicada em São Paulo e de muito menor expressão política que Brizola.


Dizem, mas não há como comprovar, que a decisão do TSE teve a forte

influência do General Golbery do Couto e Silva, então Chefe da Casa

Civil do Presidente João Baptista Figueiredo.


A decisão decepcionou profundamente Brizola, que teve de se dedicar à

fundação de um novo Partido Democrático Trabalhista-PDT e à

popularização de uma sigla até então desconhecida.


Com a nova Lei 6.767, criou-se, então, numa primeira etapa, 6 partidos: a

ARENA praticamente se converteu no PDS, enquanto o MDB se subdividiu em

5 agremiações: o PMDB e mais PTB, PDT, PT e PP.


Outra dificuldade de Brizola foi que, durante sua ausência do país, haviam

surgido novos movimentos populares, como o novo sindicalismo centrado em

torno dos trabalhadores metalúrgicos de São Paulo e seu líder Lula da Silva,

além das organizações congregadas pela Conferência Nacional dos Bispos

para cuidar dos pobres.


Brizola só os conhecia pelo noticiário dos jornais, o que não favorecia a uma aproximação, pois, em Política, o desconhecido costuma ser valorado negativamente.


Em apenas dois anos, o PDT se estruturou no Estado do Rio de Janeiro (onde

Brizola disputara a eleição de 1962) e no Rio Grande do Sul (onde viva grande

número de admiradores de Getúlio e de Brizola). Em 1982, o PDT venceu as

eleições no Estado do Rio de Janeiro, elegendo Leonel Brizola governador,

Darcy Ribeiro vice.


A bancada federal eleita para a Câmara dos Deputados foi de 23 deputados. Em 1986, o PDT filiou-se à Internacional Socialista. Nessa eleição o PTB, de Iara, elegeu apenas 8 deputados federais.


























































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